“Mulher Negra: a dor, a força e a solidão” por Jéssica Marcondes
(ANO 03 — NUM 01)
A solidão dá mulher negra é real e cada vez mais presente.
Vemos, desde crianças, mães, avós, tias, conhecidas criando seus filhos sem nenhum auxílio e suporte paternal.
Já cheguei a pensar que isso era independência, força, mas na verdade era abandono.
A imagem da negra forte que se vira em 24h para trabalhar fora e dentro de casa, cuidar dos filhos (seus e dos outros) e que aos finais de semana ainda procura bicos que ajudam no orçamento mensal era a coisa mais comum de se ver há 10 anos atrás. Mas essa realidade é bem mais antiga do que se imagina.
Quando se cresce uma jovem negra em uma sociedade preconceituosa, percebe-se que os desafios a serem enfrentados vão além de ter um bom estudo, um bom serviço e entrar numa boa faculdade.
Na juventude conhecemos o amor e a troca pelo proposto, pelo padrão aceitado socialmente.
Até tomarmos consciência de que nosso corpo, nossa beleza como negra vale muito mais do que os cartazes e desfiles que os exibem de forma pejorativa, passam-se dias, meses, anos de ódio por ser quem somos. Ou seja, ser negra.
A negação da cor que não se pode tirar, do cabelo que gosta de se emaranhar, do nariz que não afina e dos lábios que são mais grossos que palavras rudes entristece e a aceitação é quase utópica, porém, quando acontece, é vitória.
Bravo!
Amo minha cor, minha raiz, meus traços.
Sou grata pelas costelas que se romperam na hora do meu parto.
Força e dedicação. Sou inteira.
A força tomou lugar da dor, mas a solidão continuou.
Mesmo sendo linda, tem gente que diminui por peito e bunda, usa, abusa e some na neblina.
Encontrar um amor verdadeiro é como procurar agulha do palheiro, e, até mesmo quando encontramos, somos deixadas ao relento, depois de meses ou anos, ouvindo um discurso de “Eu preciso de um tempo”. Sabemos que seu tempo era a garota branca presente na sua vida desde sua infância.
A decepção é amiga íntima, entra em casa sem bater, abre a geladeira e põe o pé no sofá.
Você finge não se abater. Você é forte ou se faz de forte só pra não perceberem a sua dor, a sua solidão.
Se garotas amadurecem cedo, as negras aceleram o processo.
Levantar e seguir é trabalho diário. Se valorizar e se amar é passo a passo.
Seguimos sozinhas, mas buscando em cada irmã a companhia.
Seremos exemplo para as próximas crias que nos olharão e irão dizer “é forte a minha tia”.
Imagem ao lado: Artista desconhecido, Baiana, 1850. Óleo sobre algodão, 77.5 X96cm